Fundo de Propriedade Coletiva da Terra Mantém Preços Acessíveis – Agora e Para Sempre
por Daniel Fireside
Uma agenda que coloca as pessoas em primeiro lugar: Moradia
Desde a quebra sofrida após o recente boom na habitação, os noticiários estão repletos de histórias de proprietários de imóveis em pânico, disparada nos números de retomadas de imóveis, e bilhões em recursos dos contribuintes direcionados para insolvências.
É especialmente surpreendente, então, que nem mesmo um proprietário de imóvel, condomínio, ou compra cooperativada do Champlain Housing Trust (CHT) de Vermont tenha experimentado uma retomada no último ano. Tampouco os mais de 1.600 apartamentos de CHT devem temer desocupação por conta do desmoronamento do sistema de financiamento habitacional. Este é o tipo de histórico que trouxe para o CHT o reconhecimento internacional e motivou uma revolução na acessibilidade da moradia.
Nos últimos 25 anos, o CHT tornou-se um dos maiores provedores de moradia acessível na área de três municípios em torno de Burlington , a maior cidade do estado, e onde estão os imóveis mais caros e o mercado de aluguel mais exclusivo.
A gênese da idéia tomou forma no final da década de 1970, quando o ambientalista Rick Carbin fundou o Vermont Land Trust para preservar o espaço aberto à medida que empreendedores compravam as fazendas da área. Em vez de comprar e manter vazia a terra, como fazem alguns fundos de propriedades, o fundo comprou propriedades não desenvolvidas nos limites das áreas urbanas, e as revendeu, frequentemente com lucro, mas com limites estritos sobre desenvolvimentos futuros.
Então, no início da década de 1980, especuladores ricos de fora da cidade começaram a fazer subir o custo da moradia em Burlington. Moradores antigos da classe operária foram sendo expulsos de suas moradias e vizinhança pela alta dos preços. A frustração atingiu o ponto máximo quando o poder público fez um acordo com grandes empreendimentos para a construção de apartamentos de alto padrão com a maravilhosa vista da orla. O descontentamento dos eleitores com este plano para a privatização do espaço público levou a uma vitória inesperada para a prefeitura do irritante candidato socialista Bernie Sanders e seu partido vale-tudo Progressive Coalition [Coalizão Progressista].
Sanders e a coalizão rapidamente buscaram desenvolver instituições que tivessem um impacto de longo prazo. Eles estabeleceram o Burlington Community Land Trust como uma corporação independente sem fins lucrativos em 1984 com apoio da Câmara da cidade de Burlington e $200.000 de capital inicial. Enquanto o fundo foi desenhado em princípio para a promoção de propriedade sustentável da moradia na cidade, a Lake Champlain Housing Development Corporation, estabelecida na mesma época, focou em propriedades de aluguel nas áreas ao redor de Burlington. As duas organizações se fundiram em 2006 para formar a instituição sem fins lucrativos CHT.
O fundo tornou-se uma parte central do esforço de moradia acessível da área – de tal forma a fazer uma ponte entre a divisão ideológica entre uma abordagem mal-sucedida de livre-mercado e uma intervenção muito rígida do estado. Políticos de ambos os lados – Democratas e Republicanos – acharam difícil se opor a um programa que promove a propriedade e oferece a locatários de longo prazo um “pedaço do sonho Americano”.
Fundo de Moradia 101
A compra da terra através de um fundo habitacional começa quando o fundo adquire um pacote através de compra, retomada, abatimento de impostos, ou doação. O fundo providencia a construção de uma unidade de moradia no terreno, nos casos em que não houver nenhum imóvel, e então vende o prédio mas retém a propriedade do terreno. O novo dono do imóvel faz um leasing da terra por uma quantia nominal (por exemplo, $25 por mês), geralmente por 99 anos ou até que a casa seja revendida.
Este modelo promove a moradia acessível de várias maneiras. Em primeiro lugar, os compradores devem respeitar o critério de baixa-renda. Segundo, o preço de venda do imóvel é reduzido porque ele não inclui o preço do terreno. Em terceiro lugar, o fundo trabalha com as entidades financiadoras para baixar os custos de financiamento usando a garantia da terra como parte do cálculo do financiamento. Isto reduz o valor da entrada e outros custos de encerramento, e elimina a necessidade de seguro de financiamento particular. No total, o fundo consegue cortar o custo da propriedade da moradia em 25% ou mais.
Para o membro da CHT há muito tempo Bob Robbins, comprar uma casa através do fundo foi a única opção viável. “Nós não tínhamos acesso ao capital para entrada em um imóvel comum, e no nosso nível de renda não teríamos acesso a financiamento”, diz Robbins. “Através do CHT, pudemos comprar uma casa de $99.000 com somente $2.500 de entrada.”
Diferente dos programas do governo federal que somente beneficiam o primeiro comprador, o CHT mantém a propriedade acessível de forma permanente ao restringir o lucro que os compradores mantém quando decidem vender a casa. De acordo com os termos do leasing do CHT, os proprietários recebem de volta todo o valor residual mais o valor de mercado do capital empregado em qualquer benfeitoria que tenha feito no imóvel. Contudo, eles recebem somente 25% de qualquer acréscimo ao valor da casa, e nada sobre o acréscimo ao valor da terra.
Este modelo dá ao comprador acesso aos benefícios de propriedade do imóvel além de suas posses, incluindo dedução de impostos, aumento do patrimônio líquido, e custo estável da moradia. Em troca, o comprador abre mão de obter grandes lucros na transação. Um estudo de venda de imóveis de fundos a uma segunda geração de compradores mostrou que os envolvidos relatavam um ganho líquido de 29% do capital investido. “Este não é um retorno astronômico”, diz a diretora executiva do CHT, Brenda Torpy. Mas a maioria de proprietários do CHT nunca teria tido a chance de comprar sua casa de outra maneira.
“Estamos tentando deter a concentração de terra nas mãos de uma minoria rica”, diz Torpy.
O CHT tornou-se uma força cada vez mais importante no mercado imobiliário de Burlington, bem como nos municípios vizinhos, mesmo com a troca de administrações municipais. Depois de 25 anos, o fundo tem mais de 2.100 residentes vivendo em suas moradias, condomínios e apartamentos, não concentrados em bolsões de pobreza, mas espalhados pela área. Desde a fusão de 2006 do Burlington Community Land Trust e do Lake Champlain Community Development Corporation na CHT, o fundo tornou-se um dos maiores gestores de propriedades para aluguel da região.
O CHT é impressionante não só por seu tamanho, mas por sua promoção do empoderamento da comunidade. Os inquilinos e proprietários do CHT votam e tem assento no seu comitê executivo, ao lado de autoridades do governo e outros residentes da cidade com conhecimento técnico, tais como arquitetos e urbanistas. O sistema é desenhado de tal forma que as partes interessadas tenham voz e voto, fazendo dele um experimento de auto-gestão democrática assim como um programa de moradia acessível.
Booms sem fracasso
O CHT emprega diversas estratégias para assegurar que o seu modelo seja bem-sucedido, mesmo durante tempos difíceis. Eles oferecem moradias abaixo dos preços de mercado – tipicamente metade do preço de uma unidade oferecida no mercado. Diferentemente dos agentes de financiamento imobiliário com interesses tendenciosos, “nós não vamos deixar as pessoas tomarem empréstimos imobiliários de risco,” diz Chris Donnelly, diretor de relações comunitárias do CHT. E se os residentes tem algum problema, o fundo trabalha com eles. “Não é paternalismo”, diz Donnelly. “É ficar ao lado dos proprietários.”
Um estudo conduzido em dezembro mostrou que a taxa de retomada entre os membros de 80 fundos de moradia em todo o território dos EUA era 30 vezes abaixo da média nacional.
Inquilinos nas propriedades alugadas do fundo também se beneficiam do compromisso do CHT com a acessibilidade e a formação da comunidade. Ao alavancar subsídios e financiamentos, e por que não está em busca de lucro, o CHT consegue manter os aluguéis até 30% abaixo das taxas de mercado, até mesmo se usam os mais rigorosos padrões ambientais de construção, e deixam fundos de reserva para cobrir futuros reparos e custos de manutenção. O fundo conserta os prédios que as empresas com fins lucrativos nem cogitam tocar. “Quando um prédio é destruído pelo fogo, nós somos aqueles que correm para restaurar a vizinhança,” diz Donnelly.
“Nós vamos direcionar estes lugares para sempre,” diz Donnelly.
Os defensores da moradia de Burlington criaram um modelo sustentável para a moradia acessível através de políticas perspicazes e de uma crença em que a moradia é um direito humano fundamental e não uma commodity. Este modelo está sendo copiado em todo o país. Há 200 community land trusts nos Estados Unidos atualmente, incluindo grandes cidades com Atlanta e Cincinnati. Washington, D.C. está a ponto de criar um fundo de propriedade de terra com 1.000 unidades com apoio e consultoria do CHT. Metade destes fundos começou nos últimos sete anos somente.
De volta a Burlington, o maior obstáculo à expansão do CHT é o capital. O fundo depende de programas governamentais, concessões e doações para colocar novas propriedades no modelo. “Estamos fazendo cerca de 25 novas moradias por ano, e cerca de 25 a 30 revendas. Poderíamos facilmente fazer 100 vendas por ano se tivéssemos acesso a capital com preço baixo. O modelo já provou que funciona. Já atingiu escala. Seria uma bela maneira de atender à necessidade sem os problemas que estamos vendo a nível nacional,” diz Donnelly. Mas o financiamento público tem sido baixo ou tem diminuído nos últimos anos, e o mau tempo na economia faz com que fique mais difícil conseguir outras fontes de financiamento.
Donelly espera que os problemas recentes no mercado imobiliário convencional e alguns elogios internacionais ajudem a suscitar maior interesse no modelo de fundo de propriedade.
Em outubro, o CHT será homenageado com o World Habitat Award [Premio Habitat Mundial] na reunião da UN-Habitat, a agência global dedicada à moradia sustentável. O prêmio é um dos únicos dois concedidos a cada ano. Donnelly está orgulhoso pelo fato. “É como o Prêmio Nobel para o desenvolvimento e moradia sustentáveis.”
Daniel Fireside escreveu este artigo como parte de Purple America , o número de outono 2008 da YES! Magazine.